A origem das nossas tradições de Natal
[ história ]
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Do nosso amigo Pe. Nuno Westwood, pároco de São Julião da Barra [ Oeiras ], recebemos uma mensagem deveras interessante alusiva a esta época, que nos apraz compartilhar com os nossos leitores, católicos ou não.
Muitas histórias, um Natal
Qual é a origem de nossas tradições natalinas? Para “recuperar o sentido cristão destas festas” – como pede o Prelado em sua carta -, pode ser útil conhecer a origem dos costumes, como a árvore ou o presépio. Consideremos algumas.
A COROA DO ADVENTO
A coroa do Advento compõe-se de quatro velas com quatro ramos de vegetais, que vão se acendendo, uma a uma, nas quatro semanas que precedem o Natal.
A coroa do advento encontra suas raízes nos costumes anteriores ao cristianismo, dos povos do norte, entre os séculos IV e VI. Durante o inverno e a pouca luz de dezembro, colhiam coroas de ramos verdes e acendiam fogos, como sinal de esperança pela vinda da primavera.
No século XVI, católicos e protestantes alemães começaram a utilizar este símbolo durante o Advento. Aqueles costumes primitivos continham uma semente de verdade que agora podiam expressar a Verdade suprema: Jesus é a Luz que veio, que está conosco e que virá na glória. As velas antecipam a vinda da Luz no Natal: Jesus Cristo.
A coroa está cheia de símbolos: a luz lembra a salvação; o verde, a vida; sua forma redonda a eternidade etc.
A DATA: O DIA 25 DE DEZEMBRO
Em um primeiro momento, durante os séculos I e II depois de Cristo, os cristãos não celebravam o nascimento de Jesus. Sabia-se quando tinha morrido, na Páscoa Judaica, mas não quando havia nascido. Porém, no século III existem os primeiros testemunhos de que a festa do Nascimento de Cristo era celebrada pela Igreja, ainda que de forma clandestina, no dia 25 de dezembro.
Como em outros casos, os primeiros cristãos aproveitaram festividades pagãs para celebrar sua fé. No caso do Natal, em torno do dia 25 de dezembro, as civilizações pré-cristãs celebravam o solstício de inverno, no qual a luz voltava a aparecer e terminavam as trevas. Ainda que seja uma época de frio e de noites longas, sabe-se que a vida volta a se iniciar.
De seu lado, os romanos celebravam, entre os dias 17 e 24 de dezembro, as Saturnalia, festa dedicadas ao deus Saturno. Na época imperial, a partir dos séculos I e II, se fixou o dia 25 de dezembro como o dia do nascimento do “Sol invicto”, divindade que era representada por um recém nascido. Era um dia de festa, ninguém trabalhava, inclusive os escravos festejavam.
Logo, a já grande comunidade romana de cristãos – que ainda vivia na clandestinidade – aproveitou essa data, tão celebrada na sociedade romana, para celebrar o nascimento de Jesus, cuja data era desconhecida.
A difusão da celebração litúrgica do Natal foi rápida. Após as perseguições de Diocleciano, em 354, foi fixada oficialmente a data do nascimento de Cristo. É possível considerar que, no século V, o Natal era uma festa universal, já que na ocasião a Igreja não estava dividida.
Também os povos do Norte da Europa celebravam uma série de festas ao redor do solstício, em honra a deuses como Thor, Odin ou Yule, razão pela qual não custou aos evangelizadores adaptar as festas pagãs ao Natal.
MISSA DO GALO
No século V, o Papa Sixto III introduziu em Roma o costume de celebrar no Natal uma vigília noturna, à meia noite, “mox ut gallus cantaverit” (“enquanto o galo canta”). A missa tinha lugar num pequeno oratório, chamado “ad praesepium” (“junto ao presépio”), situado atrás do altar mor da Basílica paleo-cristã de São Pedro.
A celebração Eucarística dessa Noite Santa começa com um convite insistente e urgente à alegria: “Alegremo-nos todos no Senhor – dizem os textos da liturgia -, porque nosso Salvador nasceu no mundo”. O tempo litúrgico do Natal vai até o domingo do Batismo do Senhor, o domingo que se segue à Epifania.
OS PRESÉPIOS
O presépio é a representação doméstica do mistério do Nascimento de Jesus. O costume surgiu quando, no Natal de 1223, na Itália, São Francisco de Assis oficiou como diácono a Missa dentro de uma gruta na localidade de Greccio. Nela, após pedir permissão ao Papa Honório III, tinha montado um presépio com uma imagem em pedra do Menino Jesus e um boi e um asno vivos.
Esta representação de Greccio foi o ponto de partida de um fenômeno extraordinário de difusão do culto do Natal. A partir do próprio século XIII, a elaboração de presépios difundiu-se por toda a Itália. Os frades franciscanos imitaram seu fundador nas igrejas dos conventos abertos na Europa. Este costume propagou-se por toda a Europa durante os séculos XIV e XV.
Atualmente, o movimento da representação do nascimento de Cristo tem um grande êxito, principalmente na Itália, Espanha e América Latina. Na França, após a Revolução Francesa, em que foram proibidas as manifestações natalinas, nasceram com muita força na região da Provença. Até mesmo as comunidades protestantes, ainda que não montem presépios em suas casas, conservam, sim, a tradição de montar “presépios vivos” com crianças.
A ÁRVORE DE NATAL
É outra tradição pré-cristã que adquiriu um significado profundamente cristão. Muitas tradições, todas de procedência nórdica, reclamam o costume da árvore de Natal, ainda que nenhuma seja confiável, pelo que sua origem se perde na noite dos tempos.
Os antigos povoadores da Europa Central e Escandinávia consideravam as árvores seres sagrados. Assim, na época do solstício de inverno, adornavam a árvore mais alta e poderosa do bosque com luzes e com frutos (maçãs, por exemplo), acreditando que suas raízes chegavam ao reino dos deuses, onde se encontravam Thor e Odin.
Segundo a tradição, o cristianismo atribuiu uma leitura mais profunda a este costume. Conta-se que São Bonifácio – um sacerdote inglês que evangelizou a Europa Central nos séculos VII e VIII –, explicava o mistério da Trindade com a forma triangular do abeto (pinheiro): os frutos seriam os dons do Espírito Santo (os presentes de Deus aos homens); a estrela seria Cristo, a luz de Deus, a luz do mundo; e o tronco é facilmente assimilável à tradição cristã, que utiliza também muitas árvores em sua catequese: a árvore do Paraíso, da ciência do Bem e do Mal, a árvore de Jessé, o santo madeiro do qual se fez a cruz...
A partir do sáculo XV, os fiéis começaram a montar as árvores em suas casas. Com a reforma protestante – que suprime as tradições do presépio e de São Nicolau –, a árvore adquire maior protagonismo em muitos países do norte. A seus pés, as crianças encontram os presentes trazidos pelo Menino Jesus.
O enorme êxito da árvore no mundo anglo-saxão deve-se à rainha Vitória, que instalou uma no palácio real em 1830 e estendeu o costume a todo o reino. Em 1848, chegou até a felicitar as festividades natalinas com uma imagem da família real junto à árvore, o que contribuiu para sua difusão também nos Estados Unidos da América.
A difusão da árvore no mundo protestante fez com que, nos países católicos, especialmente do sul da Europa, se desse menos importância a essa tradição. Mais recentemente, com dois pontífices centro-europeus, o costume da árvore de Natal recuperou sua importância.
Em 1982, a árvore foi instalada pela primeira vez na Praça de São Pedro: “Que significa esta árvore? – perguntava João Paulo II -. Eu creio que é o símbolo da árvore da vida, aquela árvore mencionada no livro do Gênesis e que foi plantada na terra da humanidade junto a Cristo (...). Depois, no momento em que Cristo veio ao mundo, a árvore da vida voltou a ser plantada através dEle e agora cresce com Ele e amadurece na cruz (...). Devo dizer-lhes - confessava – que eu pessoalmente, apesar de ter uns quantos anos, espero impacientemente a chegada do Natal, momento em que é trazido aos meus aposentos esta pequena árvore. Tudo isso tem um enorme significado, que transcende as idades...”.
OS PRESENTES
A relação Natal-presente é muito antiga. Desde o início, um presente nestas datas tem sido um modo de transmitir de modo material às pessoas queridas a alegria própria pelo nascimento do Filho de Deus.
Até o século XIX, não se generalizou a idéia, fruto das classes médias, da burguesia. Reis Magos, Menino Jesus, São Nicolau ou Papai Noel, Befana, Olentzero, Caga Tiò... são personagens que, nas festas natalinas, trazem presentes às crianças. Mas muitos destes personagens têm uma longa história. Contaremos duas.
Reis Magos
A importância dos Reis Magos é principalmente religiosa: eles são os protagonistas da Epifania, isto é, da manifestação de Deus a todos os homens, de todos os povos da terra.
Já tinham sido anunciados no Antigo Testamento (o Livro dos Reis e Isaias), e São Mateus os descreve como “magos do Oriente”. Que fossem três, e reis, é uma tradição que se consolidou rapidamente, como o demonstrou Orígenes, teólogo do século II. Provavelmente, tratava-se de sacerdotes da Babilônia, do culto de Zoroastro, dedicados à astrologia.
No século V, Leão Magno fixa em três o número de reis, representando assim as três raças humanas: a semítica, representada pelo rei jovem; a camítica, representada pelo rei negro; a jafética, representada pelo rei mais velho. No século XV, com o descobrimento de novas terras, adquirem seus traços definitivos.
Ao longo da história, têm recebido nomes como Magalath, Galgalath e Serakin; Appellicon, Amerin y Damascón; ou Ator, Sater e Paratoras. Os nomes Melchior, Gaspar e Baltasar aparecem pela primeira vez em um pergaminho do século VII.
Os restos dos reis magos, após serem encontrados por Santa Helena, em Saba, viveram em agitadas viagens por toda a Europa, até que repousaram finalmente na catedral de Colônia.
Papai Noel
São Nicolau foi um bispo cristão que viveu na atual Turquia, no século IV. Ainda que tenha feito muitos milagres, o mais conhecido foi o que restituiu a vida a três meninos que haviam sido esquartejados por um carniceiro que havia colocado seus restos em uns sacos. Por isso, sua figura esteve sempre unida às dos meninos. Sua devoção sempre existiu tanto na Igreja católica como na ortodoxa. Logo se associou o santo aos presentes que as crianças recebiam no Natal.
A imagem atual é uma mistura do Sinterklaas holandês e tradições escandinavas que haviam chegado aos Estados Unidos. Sua origem remonta a uma noite de 1822, quando o pastor protestante Clément C. Moore criou o personagem Santa Claus. No dia 24 de dezembro, ao cair da tarde, sua esposa descobriu que faltavam algumas coisas para a ceia e pediu a seu marido que fosse comprá-las. Na volta, Clement se entreteve algum tempo com o guarda Jan Duychinck: um holandês gordo e efusivo, com vontade de contar as tradições natalinas de sua terra, em particular os costumes relacionados com Sinterklaas (São Claus).
Já em casa, enquanto a esposa preparava a ceia, redigiu um poema para suas três filhas, contando a visita que lhe havia feito São Nicolau. A figura que descreveu era a mesma de Duychinck: um indivíduo cordial, gordo, de olhos chispeantes, nariz vermelho e faces rosadas, que trazia consigo um cachimbo e dizia “ho, ho, ho”. Ainda que o personagem se chamasse São Nicolau, nada tinha a ver com o bispo.
(*) Artigo escrito por M. Narbona, Doutor em História.
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