segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

Os Votos dos nossos Amigos - 11


De Jorge Castro recebemos via email, agradecemos, retribuímos e partilhamos com todos:


Amizades,


A todos quantos receberem esta mensagem direi, apenas, que este contacto não se tratou de acaso, mas acto deliberado. A escolha foi criteriosa, a motivação infinita. Afinal, está aí o Natal, como sempre, anunciando o eterno recomeço que nos redima ou que nos permita novos voos.


É um exemplo notável que a Natureza nos dá em cada ano que passa. Porque havemos nós, então, de a contrariar, ficando tão avessos a ela?


Depois, um poema que vos deixo, como sempre nesta quadra. Extenso, desta vez, que os tempos vão complexos. Espero a vossa condescendência.


Respiremos fundo, procuremos a saúde, cultivemos a arte da solidariedade e enfrentemos o novo ano com renovado alento.


Eu quero ir por aí. Vamos?


Jorge Castro


Crónica de Natal e Presépio em 2009


quem sabe o que é o Natal?

dos anjos? dos passarinhos? dos sinos? dos azevinhos?

ou de um et coetera e tal

que vem por bem ou por mal em festa do eterno início?


desse início-recomeço festa ao rés do precipício

das passadas que não meço nem se me dá de ser vício

mas que não seja só prendas

daquelas com que pretendas dar sustento ao artifício


eu gosto dela quentinho

com boa mesa – bom vinho – amizades e carinho

e ter no fundo a certeza de que o universo todo

no desconcerto é certinho


muito lamento entretanto que o Homem-do-saco

o tal

sendeiro – bruxo – macaco

que me atormentava tanto em pequeno – vejam lá

ao crescer é o Pai Natal

hipotecando-me em prendas o dia que lá virá


no presépio o burro afoito de tanto correr no emprego

está com as pernas num oito

arfando desassossego


e sorte tem ele

vereis

pois que a ovelha – coitada – sem emprego nem dez reis

deixou no prego os aneis p’ra dar aos filhos consoada

depois de tanto mungida

depois de tão tosquiada


talvez com usurpação

de nome que se daria ao cordeiro do Senhor

um dos tais filhos da dita

que no meio da desdita lá chegou a ser doutor

com Bolonha de permeio

bacharel – licenciado – pós-graduado – mestrado

é hoje uma mais-valia por elevada função

de caixa em supermercado


a vaca palhas rumina e teme a avaliação

que penalize auto-estima

ou que lhe apouque a pensão


mais ao fundo os três reis magos

aos camelos dão afagos aprestando-se à viagem

pois os camelos – coitados – com dois dedos de forragem

cobrem caminhos sem fim sem gasóleo nem portagem


São José

Virgem Maria

trocando olhares entendidos da miséria dia-a-dia

em que se encontram perdidos na busca do que não há

pensarão porque se adia a ida pr’ò Canadá

ou para a Austrália quiçá

na ânsia de um novo dia

que lhes traga a alegria de viver que não há cá


já o Menino Jesus

antevendo milagreiro essa desgraça de truz

de vir a morrer na cruz por ser ele o agnus dei

ou só por ser carpinteiro

pensa com as suas palhinhas na play-station brincando

na perdição das alminhas que se deixam ir tentando

compradas por sucateiro que faz das prendinhas lei


brilhante só a estrela

que brilha e brilha e rebrilha como se o mundo fosse ela

aparece na tv essa magna maravilha

dando o corpo aventureiro em fugaz telenovela

consta até que tem prevista

uma carreira de artista e romance com banqueiro

esse nem está neste enredo

tem um consórcio com o medo – outro com a alta finança

vende presépios a eito – compra armamento sem jeito

sempre em favor da criança (tem lá por casa dois netos…)

importa fatos de treino – carros – pessoas – faiança

negoceia sentimentos – dá de barato os afectos

para cumprir o preceito: «venha a nós o vosso reino»

que mais dia menos dia salvará a economia


que fazer? bradar aos céus?

renas por cá? ora adeus

frango capão – bacalhau – polvo – peru do Natal

estes sim são cá dos meus


rabanadas – aletria – se calhar uma filhó

bem regadas de alegria

em memória de uma avó que sem ela eu nem seria


com um abraço aos amigos que hão-de ficar contentes

e um outro aos inimigos mesmo com ranger de dentes

que bem visto é como os figos

mesmo sem flor dão sementes


quanto ao mais – concidadãos

aprendei a dar as mãos contra o que der e vier

que p’lo Natal sois irmãos

e o Natal sempre vem – disse-o um poeta tão bem

quando algum homem quiser.


Boas Festas e Feliz Natal!


- Jorge Castro

17 de Dezembro de 2009


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